A International Telecommunication Union ITU de 1865

Em 17 de maio de 1865, era fundada a International Telegraph Union, que anos depois daria origem à International Telecommunication Union (ITU), uma das instituições internacionais mais antigas em operação, responsável por regulamentar padrões globais de telecomunicações, espectro radioelétrico e infraestrutura digital.
Na segunda metade do século 19, a Europa, que vivia um momento de grande desenvolvimento industrial e tecnológico, experimentava também uma grande expansão nas comunicações telegráficas, tendo nestas conexões transfronteiriças uma ferramenta essencial para o comércio, a diplomacia e a segurança.
Esta expansão (até certo ponto desorganizada) das redes telegráficas em nível global acabaria por gerar um problema “técnico”, onde, sempre que as linhas cruzavam fronteiras nacionais, as mensagens tinham que ser interrompidas e traduzidas para o sistema específico da próxima jurisdição.

Isso se devia ao fato de, antes da criação da ITU, não haver nenhuma organização formal que regulasse as comunicações internacionais. Muito embora acordos bilaterais ou regionais tentassem normatizar de alguma forma as telecomunicações (como os tipos de equipamentos, “códigos” a serem utilizados e taxas/tarifas a serem praticadas entre as partes) cada país estabelecia seus próprios padrões, o que frequentemente gerava incompatibilidades e dificuldades técnicas para a operação de sistemas interconectados.
Isso acabaria por deixar claro que estabelecer um sistema de comunicação internacional eficiente e globalmente padronizado, e que viesse a facilitar a transmissão de mensagens entre países distintos, era uma necessidade cada vez mais evidente e urgente, especialmente diante do aumento do número de cabos telegráficos transnacionais.
Nasce a União Telegráfica Internacional
Sentindo a necessidade de substituir todos esses acordos por um acordo multilateral abrangente, caberia ao governo francês a iniciativa de convidar os principais estados europeus (da época) para a realização da primeira Conferência Telegráfica Internacional.
Ocorrida entre os dias 1 de março e 17 de maio de 1865, na cidade de Paris, a conferência reuniu representantes de 20 países europeus, com o objetivo de criar uma estrutura normativa comum para os sistemas telegráficos.
Entre os membros fundadores estavam o Império Austríaco (atual Áustria e Hungria), Grão-Ducado de Baden (atual Alemanha), Baviera (atual Alemanha), Reino da Bélgica, Reino da Dinamarca, Império Francês, Reino da Grécia, Cidade livre de Hamburgo (atual Alemanha), Reino de Hanôver (atual Alemanha), Reino da Itália, Países Baixos, Reino de Portugal, Reino da Prússia (atual Alemanha), Império Russo, Reino da Saxônia (atual Alemanha), Reino da Espanha, Reino unido da Suécia e Noruega (na época, eram um reino unificado), Confederação Suíça, Império Otomano (atual Turquia), Reino de Württemberg (atual Alemanha).

A França, anfitriã do tratado, teve papel central na articulação política, enquanto a Prússia (então um Estado-chave na Confederação Germânica e de grande influência na Europa Central) trouxe expertise técnico, dada sua avançada rede telegráfica e pelos acordos que já havia conduzido. O objetivo era claro: estabelecer normas comuns para interoperabilidade, tarifas e resolução de disputas.
Do acordo firmado durante o encontro, a Convenção Internacional do Telégrafo, (um tratado intergovernamental que estabelecia os princípios básicos da telegrafia internacional) nascia no dia de hoje a International Telegraph Union (União Telegráfica Internacional).
Sob a forma de anexo à Convenção, figurava ainda o Regulamento para o Serviço Internacional (também conhecido como Regulamento do Telégrafo), abordando questões de detalhes administrativos, como o funcionamento em conjunto dos equipamentos, procedimentos operacionais e liquidação de contas.
Entre as normas básicas adotadas em decorrência do acordo, estavam o uso do código Morse como alfabeto telegráfico internacional, a proteção do sigilo da correspondência e o direito de todos de usar a telegrafia internacional. As partes contratantes também se reservaram o direito de interromper qualquer transmissão que considerassem perigosa para a segurança do Estado ou que violasse as leis nacionais, a ordem pública ou a moral.

O acordo multilateral estabeleceria também tarifas uniformes para trocas internacionais de telegramas, com todas as taxas a serem praticadas definidas e publicadas sob a forma de uma tabela anexa à Convenção.
A conferência ainda estipularia que, a fim de se poder acompanhar o progresso técnico e administrativo, a Convenção deveria ser revisada periodicamente por conferências internacionais realizadas nas capitais dos Estados membros. Além disso, ela previa que os países não signatários da Convenção pudessem posteriormente aderir a ela, por meio de notificação ao Governo Francês.
Evolução
Nas décadas seguintes, a International Telegraph Union expandiria seu escopo e competências para além do telégrafo, acompanhando o surgimento de novas tecnologias como o telefone e o rádio.
Logo após a invenção da comunicação sem fio, ocorreria, em 3 de novembro de 1906, a Primeira Conferência Radiotelegráfica Internacional, quando uma nova instituição para incorporar a regulamentação das radiocomunicações seria criada, a International Radiotelegraph Union (IRU), tendo como administrador principal a própria International Telegraph Union. Cada uma dessas entidades mantinha assim um foco e uma bagagem normativa distinta: a primeira em comunicações por fio e a segunda, em comunicações sem fio.

Algumas décadas depois, durante a conferência de Madri/Espanha, em 9 de dezembro de 1932, num movimento de consolidação que refletia a convergência das tecnologias de comunicação, estas duas entidades viriam a se fundir oficialmente, passando a atuar sob a denominação atual International Telecommunication Union – ITU (União Internacional de Telecomunicações – UIT), nome pela qual é até hoje conhecida.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial e a criação da ONU, a ITU tornar-se-ia a agência especializada em telecomunicações das Nações Unidas em 1949, ganhando mandato para coordenar o espectro radioelétrico, satélites e, posteriormente, tecnologias digitais.
Desde então, a ITU expandiria significativamente seu campo de atuação, passando a incluir não apenas telefonia e rádio, mas também televisão, satélites de comunicação, redes móveis e, até certo ponto, a própria internet.
Organização
Atualmente, a ITU é organizada em três setores principais: o ITU-T (Telecommunication Standardization Sector), responsável por desenvolver normas técnicas, o ITU-R (Radiocommunication Sector), que coordena o uso do espectro de rádio e órbitas de satélites e o ITU-D (Development Sector), focado em ampliar o acesso às telecomunicações nos países em desenvolvimento.
Seus processos normativos envolvem participação aberta a Estados-membros, entidades do setor privado e acadêmicos, com decisões normativas tomadas em conferências internacionais e em seus grupos de estudo internos.
A instituição é hoje peça central na governança global das telecomunicações, harmonizando regulamentos na tentativa de evitar um eventual “caos tecnológico”, ao garantir que dispositivos e serviços de diferentes países possam interagir de maneira eficiente e segura.
Isso inclui desde padrões para redes móveis (como 5G), sistemas de TV Digital, até a definição de protocolos adotados por redes de transmissão de dados utilizadas para transportar, inclusive, a própria Internet, num trabalho essencial para a interoperabilidade global.
Influência
A ITU goza de ampla aceitação entre os países do mundo, sendo atualmente composta por 194 Estados-membro, com representação em igualdade de condições. Além deles, participam mais de 900 entidades do setor privado (como operadoras de telecomunicações, fabricantes de equipamentos e empresas de mídia), bem como representantes do setor acadêmico.
Mas isso não quer dizer que não haja críticas esporádicas quanto à sua forma de ação (burocrática algumas vezes), quando à influência corporativa ou quanto ao desequilíbrio de poder que “na prática” acaba existindo na instituição. Países desenvolvidos, como por exemplo os EUA e membros da União Europeia, acabam por influenciar mais ativamente na normatização da ITU, enquanto nações em desenvolvimento muitas vezes dependem de sua assistência para reduzir desigualdades digitais.
Outro ponto que vem produzindo muitos debates (e desavenças) é quanto à governança da Internet, com a instituição defendendo que, assim como regulou o telégrafo, o rádio e as redes telefônicas, deva ter um papel mais ativo na regulamentação da grande rede.

Isso passaria pela regulamentação da infraestrutura crítica (como os cabos submarinos que formam os backbone mundial) de forma a garantir a segurança, estabilidade e interoperabilidade em nível global. Inclui ainda a intenção de gerenciar endereços IP e nomes de domínios, recursos hoje controlados em sua maioria por instituições norte-americanas.
Mas talvez o ponto mais controverso seja o do modelo proposto de “taxação” do tráfego global conhecido como “sender pay” (remetente paga). Nele, grandes produtores de conteúdo e de tráfego (como o Google, Facebook, Netflix, Amazon, etc…), passariam a pagar pelo uso intensivo dos sistemas de telecomunicações locais, ajudando a financiar a expansão das redes de dados ao redor do mundo (que servem a eles próprios em última instância) e a custear a infraestrutura em países menos desenvolvidos, promovendo a inclusão digital dos quase 3 bilhões de humanos ainda sem acesso à rede mundial de computadores.
Contudo, apesar de algumas críticas e insatisfações, a instituição é amplamente reconhecida como um fórum essencial para o desenvolvimento harmonioso das comunicações globais, sem a qual a interoperabilidade seria inviável.
A importância da ITU para a história das telecomunicações é inegável. Sem a padronização e a cooperação internacional promovidas pela instituição, o desenvolvimento tecnológico teria enfrentado barreiras muito maiores, provando que a cooperação internacional é indispensável em um mundo digital.
Desde o telégrafo, esta instituição secular permanece no centro das discussões sobre o futuro das comunicações globais, seja na expansão das tecnologias de transmissão de dados de alta capacidade de viabilizam a Internet, seja na regulamentação das novas gerações de redes móveis.
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Vídeo(s):
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Mais em:
- A fundação do Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos IEEE em 1963
- O American Institute of Electrical Engineers AIEE de 1884
- O World Wide Web Consortium W3C de 1994
- A Primeira Request for Comments (RFC) de 1969
*As imagens utilizadas nesta postagem são meramente ilustrativas e foram obtidas da internet.
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